domingo, 27 de maio de 2012

Sequelas


Há quem considere que as sequelas de histórias e filmes, as sequências incontáveis de histórias de senadores ex-exterminadores, rockys e rambos reformados da pornografia "old-school" , muitos tiros, baba e sangue, e de guerras intergalácticas de ciência fictícia, amores improváveis, outros impossíveis, não são mais do que uma reinvenção preguiçosa e ao de leve dos mesmos enredos, das mesmas emoções, do mesmo suspense, do heroísmo, e da acção que já nos prenderam numa primeira vez com os finais deixados em aberto de forma a assegurar sem riscos um sucesso consecutivo e expectável... sem muito trabalho. E assim, em cada sequela levamos com as mesmas personagens, os mesmos dramas ou comédias de cada uma, e deixamo-nos entreter com histórias que por muitos episódios que tenham ou que se lhe inventem facilmente deixam antever o seu final e que este, na maior parte das vezes, já poderia ter acontecido logo no primeiro pois os restantes nada acrescentam para além de tempo passado. Mas ainda assim temos que pagar para ver, e ver para crer... senão... nem nós sabemos o senão...
Sequelas e remakes, e todas as coisas que não saem bem à primeira, que precisam de outro ou mais "takes" com falsas partidas, diálogos esquecidos, gestos ensaiados fora de tempo, gafes, risos, nervos, erros, muitos erros, sem garantia de se conseguir perfeição num instante, apenas a sombra de um permanente falhanço em cada tentativa, terão sempre os seus e os nossos "senão".
 

domingo, 20 de maio de 2012

A nossa selecção


"O incomodado que se mude." É um dos provérbios portugueses (não conheço nenhuma versão noutra língua) mais avessos aos nossos brandos e bons costumes, e falta completamente para com a justiça per se e mais ainda para com os incomodados que estão bem onde e como estão e que não se conformam em estar de outra forma qualquer que não seja a que escolheram em primeiro lugar. Mas, felizmente, este incomodado da sua época (o da foto), mudou de  vida, zarpou em busca de uma resposta para o seu incómodo e trouxe como souvenir do equador a chave do mistério da evolução: a revolução da força do mais apto sobre a força do mais forte.
Fenótipos e genótipos à parte e voltando ao provérbio, com o qual nunca atirei a ninguém, não gosto dessas expressões do género "eheh, vai buscar...", "embrulha lá isso...", "toma!", apesar de não gostar dele tenho que admitir que contém mais verdade do que eu admitiria à primeira, e confere ao incomodado mais atitude do que humilhação se este se vergar à mudança que lhe é proposta, ou que se auto-propõe. Pois se algo nos incomoda ou desagrada e não nos conseguimos adaptar a esse facto, o melhor realmente é procurarmos outra coisa que nos satisfaça mais e melhor. Podemos também aproveitar a boleia e treinarmos o acreditar em que tudo, mais cedo ou mais tarde, com ou sem factor de incómodo pelo meio, tudo nos deixará de satisfazer ou agradar tanto, e por isso o melhor é habituarmo-nos a procurar o que for melhor para nós, sempre, embora o que seja melhor para nós não seja sempre (quase nunca) o que de melhor há... Temos que escolher o melhor que está à nossa altura, na altura em que o procurarmos. Nada de nos esticarmos desesperadamente ao estilo lamarckista das girafas e dos primatas de braços mais compridos do que as pernas. Quem quiser bolota, que a trepe...

domingo, 13 de maio de 2012

Mesa para um(a)



Tenho um amigo que tem um blog fantástico. Escreve todos os dias úteis, escreve acerca de política, bola, actualidade, cidadania, literatura, portugalidade, e eu admiro-o por conseguir acompanhar todos os acontecimentos com as suas reflexões. Há uns tempos atrás disse-me que não sabe quantas pessoas lêem o seu blog. Desactivou essa opção porque, diz ele, escreve por e para si. O seu blog é um escape, um entretimento, um desafio para si próprio.
Penso que acontece a toda gente... ao ouvir determinadas coisas, até afirmações simples como a dele, acabamos por entender melhor atitudes e opiniões nossas. Por exemplo, há uns anos atrás ouvi no Câmara Clara uma entrevista à Rosa Montero (de quem nunca li nenhuma obra, nem depois disto...) em que ela disse que quem lê vive mais. Nunca mais me esqueci disso, e foi graças a essa afirmação que entendi e agora consigo justificar o porquê de eu não gostar muito de literatura contemporânea recente. A TV, o cinema e a internet provêem-nos de realidade e ficção q.b. para não me interessar com o que já conheço e assisto no dia a dia, ou consigo facilmente imaginar. Por isso prefiro a escrita de outras épocas, realidades do passado recente das quais pouco ou nada sei, e assim sim, consigo realmente envolver-me com o que leio e enriquecer-me com novidade e  mais vida que não conheci.
Tudo isto só para dizer que me revejo no que o meu amigo me disse. Apercebi-me de que, neste momento, também eu escrevo por e para mim, e acho que se nota...
Revejo-me também nas palavras de Henry Miller, apaixonado pela paixão, para quem uma das coisas mais difíceis de admitirmos e entendermos é que sozinhos não controlamos nada. Que não existem atalhos para o que queremos e que o mais difícil dos caminhos é, no fim das contas, o mais fácil de todos. Que devemos saber esquecermos-nos de nós próprios.
Mas, de momento, não sei me dar sem que assim pareça...

domingo, 6 de maio de 2012

A "nódoa" escarlate...


Há quem sonhe em ir às Caraíbas, ou às nossas antípodas geográficas, ou à Patagónia ver os homens de pés grandes, ou até ir ao espaço como turista à moda do "Ulisses 31"... Eu quero é um dia ir a Espanha, isso mesmo, à festa da Tomatina em Buñol. Penso nisso todos os anos ao ver as imagens nos telejornais e fico com muita pena de nunca ter ido embora saiba que nunca lá irei... Para quem nunca viu nem ouviu falar, trata-se de um festival de arremesso de tomates maduros, aos milhares... É como um encerro, só que em vez dos touros há camiões carregados de tomates que ao passarem munem a multidão dessas armas suculentas para que todos apontem, atirem e acertem em quem quer que seja, de preferência em toda a gente. A tradição é espanhola mas bem que lhes poderíamos emprestar o nosso " Aí vai molho!" a modos de grito de guerra. É que a praça principal de Buñol, com os prédios completamente revestidos de plásticos de protecção, torna-se uma piscina de polpa de tomate onde se debatem os guerreiros "so-so" pacíficos... Mas atenção, existe uma regra: esmagar os tomates antes de arremessá-los para não magoar (tanto). Claro que é necessário um tanto de atrevimento e outro tanto de alegria para encarar os golpes, sobretudo os não regulamentares, mas acredito que no meio de tanta gente haja quem mereça levar com a tomatada multidireccional e incessante, mas também quem só apanhe e não consiga acertar em ninguém... gente que apesar de ter tanto tomate à mão não os consegue encontrar no sítio... gente que encolhe as suas vontades e as disfarçam até do contrário porque se preocupam mais com que os outros pensam do que com aquilo que querem, gente sem garra... Gente que não se dá conta de que os momentos passam e são únicos com tudo e todos quanto comportam em si, que existem segundas e até mais oportunidades na vida mas que nenhuma delas se repete com as mesmas condições, que o tempo não volta atrás, que só temos esta hipótese para errar e tentar acertar. A tentativa não pode ficar para uma próxima, porque não há uma próxima. Esta é a nossa vez.
Alguns sabem da sua fraqueza em inverter a tendência de que sofrem para não intercederem, a seu próprio favor, e virarem o jogo, e mostrarem a garra que têm, mais pequena ou maior do que pensam, e apostarem a vida que corre no que querem...
Mas há quem não saiba, e também quem mesmo sabendo nunca irá fazer nada por si. Infelizmente, isso não impede ninguém de continuar a acreditar neles e de investir e insistir na sua conversão... à toa? No lo sé... 
Não seria má ideia irmos marcando essas pessoas à medida que as conhecemos e que nos marcam, só para evitarmos a outros de eventualmente também perderem o seu tempo. Marcá-las com um tomate escarrapachado, uma Tomatina individual apontada a quem tem falta de... firmeza... Poderia ser um último e certeiro incentivo à mudança, quem sabe?



"La vie se rétracte ou se dilate à proportion de notre courage." ( Anaïs Nin
"True life is lived when tiny changes occur." ( Leon Tosltoï )