domingo, 22 de abril de 2012

A meta (física) da inseparabilidade


Adoro estas duas figurinhas de feições toscas que constituem um muito pequeno detalhe emparelhado no espólio do escritor e artista Boris Vian há mais de sessenta anos - dois ímanes criados para alguém se distrair a aproximá-los aos poucos até que as forças dos seus campos magnéticos não resistam mais ao impulso da atracção da polaridade contrária de cada um para se colarem um ao outro com um beijo, um beijo inseparável pela vontade destes dois pequenos seres metálicos pintados de cores contrárias mas não completa nem perfeitamente complementares, duas cores atribuídas contra o senso de se atribuir o azul aos homens e o vermelho às mulheres, numa intenção de inversão da força dos sexos, ou da sua igualização, não sei. No entanto, o detalhe da posição das mãos de ambos - ela, de azul, com os braços ao longo do corpo, as mãos inertes junto de si como quem espera a resposta a um convite já entregue, e ele, de vermelho, as costas ligeiramente curvadas para a frente em posição de avanço tímido, as mãos arrumadas nos bolsos das calças para as impedir de revelarem mais intenção do que a que lhe fica bem, leva-me a acreditar na sugestão da equidade da atracção de ambos, das suas forças e dos seus medos, e do conhecimento partilhado por ambos de que a sua proximidade e (in)separabilidade deveria depender apenas deles. Olho para eles e vejo um brinquedo velho, sim, um objecto de uma modernidade também já ultrapassada, mas é um brinquedo descaradamente poético, inocente só mesmo de relance, uma representação física de uma explicação deliciosa e simples do romantismo do querer. A entrega única, impulsiva e incomparável de quem quer o que quer e não consegue escolher nem fazer mais nada pese embora todas as forças semelhantes e contrárias que o atraem, os porques sim e os porques não. 
Não nos quero comparar a estas duas simpáticas criaturas, corpos gémeos na vontade magnética guiada para uma quantidade e intensidade infinitas de beijos recatados e invejáveis, mas se toda a matéria existente é constituída por átomos, quarks e leptões, electrões que giram em todos os sentidos, eu acredito que a profundidade dos nossos sentimentos é mais profunda do que o fundo dos nossos corações. Acredito que nascem e residem num nível particular generalizado em toda a nossa extensão física, à flor das partículas, ou num nível sub-atómico, independente, tão nosso e tão desconhecido, gerador de tudo o que somos, dos nossos cinco e demais sentidos, de tudo quanto nem nós sabemos sobre nós próprios, e dos nossos pontos de irresistibilidade ao que desejamos... 

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